terça-feira, novembro 21, 2006

Dinheiro... se eu tivesse sobrando

Hoje é dia da Confraria de Crônicas, Contos e Causos do Cotidiano... que, aparentemente vai aumentar em breve....

Dinheiro, se eu tivesse sobrando... - Sérgio Lapastina

Reclamar de falta de dinheiro é coisa de pobre... Até pq rico não reclama disso - fala a verdade, se nada mais fosse escrito depois disso vc ia morrer contente, não iria?
Então, se estamos, no texto de hoje, reclamando... é pq assumimos que somos pobres... E, vamos e venhamos, assumir que é pobre é coisa de pobre...
O pior pobre é aquele se assume pobre. O pobre de espírito.
O pior pobre é aquele que pensa pobre. O pobre de esperança: "pôxa, a mega sena está acumulada em 47 milhão, 482 mil e trezentos reais.... pra mim só os 82 mil resolvia...
Pobre... merece ganhar nada... nem os 47 milhões nem os 82 mil nem nada....
O que eu gostaria? Sinceramente?
Eu queria ganhar não esses 47 milhões, mas queria deixar acumular mais umas quatro semanas e chegar a 70 milhões e aí sim, ganhar e ganhar sozinho.
Aí sim, com dinheiro sobrando ia poder ter tranqüilidade para olhar para quem eu gosto, para quem precisa, para quem merece, para quem quer e precisa de ajuda.
Mas, perguntam ali na terceira fila, precisa ter dinheiro sobrando para ajudar ao próximo?
Depende, respondo eu. Sobrando não precisa ter, mas não pode ter faltando.
Não, prezada leitora, não estou sendo egoísta. Veja bem:
qual é a base para se promover tranqüilidade? estar tranqüilo.
qual a base para se promover a evolução? ser evoluído.
qual a base para se promover a confiança? ser confiável.
Por isso, digo e afirmo, para poder ser útil a quem precisar, é preciso que estamos utilizáveis.
Claro, ajuda não é só dinheiro, não é só financeira, mas é um pão com manteiga para quem tem fome, um copo de água para quem tem sede, um abraço para quem está triste, uma palavra para quem perdeu a esperança.
Por isso mesmo. Sim reafirmo, quero ganhar os 70 milhões ou até mais se possível. Quero ganhar para poder ofertar ganhos a quem estiver ao meu lado e estender a mão a quem precisar se erguer e apoiar quem quer subir.
Não tenho dinheiro sobrando e não sei se um dia vou ter, mas espero ter sobrando o desejo de ter, pq aí terei eternamente o que de melhor o mundo precisa, que é a crença de que é possível de que vale a pena e de que vou chegar lá.
Agora, apenas te respondendo, o que eu faria se tivesse dinheiro sobrando?
Sinceramente, não sei... acho que iria gastar um tempo, todo dia, para escrever uma crônica, para ter amigos, para dar risada, para tomar um chopp gelado, para escutar uma música, ver um filme, para beijar minha Gláucia, minha Juliana, minha Carol, meu Guilherme, brigar com a sogra, provocar a cunhada... acho que faria isso...
Quê? Mas é justamente isso que eu faço?
Então, ia fazer mais... cada vez mais, pq é isso que quero ter sobrando.... além de ganhar na mega sena.



Dinheiro, se eu tivesse sobrando... - Wagner Y. Mekaru

Sempre que se faz a pergunta: "quanto você ganha?" ou "você ganha bem?", invariavelmente a resposta vem sistemática, afirmando que ganha-se pouco/razoável ou mesmo o popular "dá pro gasto".
Raramente encontra-se alguém que admite ganhar bem ou que diga que o dinheiro sobra, talvez para evitar o "olho gordo" ou até mesmo por culpa.
O não sobrar obviamente está ligado aos gastos e necessidades que temos e quanto mais se ganha mais necessidades temos.
Mas, digamos hipoteticamente que se suas necessidades materiais cessassem , o que faria com o que sobra?
Ah, pouparia para o futuro.
Elimine isso também, seu futuro, tanto quanto o de seus familiares já foi garantido com saúde, moradia, alimentação, etc.
E aí?
Hum, ajudar o próximo? Como?
Ligaria de quinze em quinze minutos no Teleton? Daria mensalmente donativos a asilos? Distribuiria cesta básicas? Compraria leite para abrigo de menores carentes?
Legal!
Bom, mas tudo bem, isso é apenas uma hipótese, pelo menos sabemos que se você tivesse dinheiros sobrando ajudaria o próximo.
-Disfarce, não olhe agora, mas tem um menino todo mal vestido do seu lado, acho que vai te pedir dinheiro.
- Tio, tio! Falta muito pro senhor satisfazer suas necessidades? (e desapareceu numa Luz branca...)
Caramba, parece que você não está bem. Quer um pouco de água?
Enquanto vou buscar água, senta-se um senhor de cabelos grisalhos apoiado em sua bengala e começa a conversar com você. Após quinze minutos evocando a epopéia daquele senhor, você se cansa e vem me procurar, mas um som estridente metálico lhe chama a atenção; você olha para o lado e vê o rádio relógio piscando e apitando as seis e meia.
Não, não é um conto de Natal, muito embora estejamos a pouco mais de um mês dele. Também não era um filme surrealista, era apenas um sonho.
- Acorde!
Outro dia ouvi uma frase muito interessante que dizia: "assumir novos poderes implica em ter mais responsabilidades."
Então vejamos,quando passo da infância a adolescência ganho "novos poderes" com a transformação do corpo e com isso a capacidade de reprodução, logo sou responsável por isso.
Quando sou aprovado no exame para motorista recebo um documento que me habilita e me responsabiliza para conduzir veículos, já que ganhei o "poder de dirigir."
Se você é promovido na empresa está sendo reconhecido seu mérito e portanto você deve ter demonstrado que aumentou seu leque de responsabilidades. Percebeu porque te cobram tanto?
Com o dinheiro não é diferente, ganha-se mais aumentam as responsabilidades até com você mesmo, até porque a tendência é que você fique mais visado.
Para terminar a clássica pergunta: "dinheiro traz felicidade?"
Acho que não, mas certamente ajuda a viabilizar a construção da estrada pela qual iremos caminhar em busca dela.
Não está sobrando dinheiro? Tem muitos dias no seu salário? Calma que isso passa, tenha paciência porque dias melhores virão.
Hã? Ah, o que eu faria se tivesse dinheiro sobrando?
Bom, acho que iria até a venda ali da esquina e compraria um saco de pipocas para dividir com você.
Quer pipoca?


Dinheiro, se eu tivesse sobrando... - Manfredini

Conheci um senhor que morava ao lado de minha casa quando eu era garoto.
Ele era extremamente gentil, cordato, simpático, conversador e passava quase o dia todo e inclusive parte da noite, perambulando pelo bairro, ou sentado num dos bancos da praça falando com alguém, ou ainda num botequim, ao lado de sua casa, embora nunca o tenham visto bebendo.
Dê aparência bem cuidada, notava-se seu asseio pessoal bem como o de suas roupas, sempre discretas e adequadas.
Sua prosa era culta, instigante, denotando inteligência e todos o procuravam para trocar algumas idéias ou até pedir conselhos.
Também sua residência era bem cuidada, bonita, mas sem luxos ou exageros.
Segundo comentavam, ele estava aposentado, mas ninguém sabia exatamente qual havia sido sua profissão, sua ocupação e isso dava margem a toda espécie de comentários, especulações e, com o passar do tempo, criou-se uma lenda em torno dele.
Diziam ter sido um eminente juiz, outros lhe atribuíam passagem pela docência no ensino superior, onde teria obtido o grau de doutor, alguns o tinham na conta de líder sindical ilustre ou de político brilhante que, desiludido com os rumos do país, que não condiziam com sua posição ideológica, abandonara a atividade.
Atribuíam-lhe possuir bons princípios morais em decorrência da postura reservada que adotava em relação aos escândalos que vez ou outra aconteciam no bairro, aos quais nem chegava a dar atenção.
Nunca criticava nada e ninguém, nem tinha por hábito falar coisa alguma da família, resumida à esposa, pelo que sabíamos.
Não lembro se alguma vez declinou seu nome, mas todos o tratavam por "filósofo".
De vez em quando alguém surgia com alguma novidade a seu respeito:
- Soube que o "filósofo" orientou o seu Manuel na mudança do ramo de negócios e agora o "portuga" está rico!
- Ouvi a dona Marieta agradecendo ao "filósofo" pelas recomendações que passou para a filha sem juízo, parece que depois disso a "malandrinha" tomou jeito!
- Eu o vi explicando para o causídico da associação amigos do bairro como aprimorar o estatuto da entidade!
- Soube que ele deu uma "dica" ao delegado do distrito e este conseguiu resolver o caso do roubo da joalheria do Freitas.
E assim transcorriam aos dias, engordando os casos acerca do mítico e ilustre personagem.
O "seu" Antônio, proprietário do boteco, lugar onde o "filósofo" mais permanecia, acabou por se tornar intimo deste e, como seu interlocutor privilegiado, por vezes olhava desconfiado quando um dos freqüentadores surgia com mais um fato espetacular sobre nosso excêntrico amigo.
Costumava dizer:
- Vão com calma, o homem também não é nenhum santo milagroso ou profeta!
Muitos estranhavam a frase, atribuindo-a a uma possível inveja ou dor de cotovelo do taberneiro.
Os comentários menos dignificantes direcionados à ilustre figura do bairro, efetuados pelo Tonhão – apelido do dono do bar – foram se tornando mais constantes e contundentes, a tal ponto que numa tarde, um grupo ultrajado resolveu dar-lhe um ultimato:
- Ou ele explicava o motivo de suas ressalvas e críticas veladas direcionadas ao "filósofo" ou então se calasse!
Ao que prontamente ele retrucou:
- Que vida ingrata esta minha, como é triste ser um reles dono de boteco, pois nem posso fazer um simples comentário que todos já se julgam no direito de poder tirar satisfação comigo!
- Dinheiro, se eu tivesse sobrando... fechava esta porcaria de comércio e ia embora para minha cidade, para nunca mais ter que agüentar bêbado, gente enxerida, povo mal educado, pessoas de nariz "empinado" e, principalmente, os malditos "filósofos" de boca grande!