quinta-feira, maio 18, 2006

Reunião

Algumas mensagens automáticas que a gente recebe por e-mail são totalmente irritantes, mas talvez a mais insuportável de todas seja o "você foi convocado para uma reunião".
Primeiro pq quando diz convocado não te dá lá muita opção de recusa. Convidado é uma coisa, chamado tudo bem, mas convocado, meu caro, sinto muito... tem que ir.
Principalmente pq, normalmente, com raríssimas exceções, que convoca é alguém hierarquicamente superiora a você, o que te reduz as chances de qualquer tipo de reação a praticamente zero.
Mas a coisa somente tende a piorar.
O primeiro passo da total desgraça é quando você vê a data e o horário da tal reunião: invariavelmente você já tem - ou melhor, tinha - alguma coisa agendada para aquele dia, para aquela hora. Geralmente é uma consulta a um médico que você está tentando há oito meses ou - ainda mais agradável - uma outra reunião que você, a muito custo, conseguiu marcar depois de conciliar - sabe-se Santa Genoveva como - a agenda de pelo menos umas cinco pessoas.
Claro que o teu chefe sequer teve a preocupação de ver se a tua agenda estava livre: pra que, ele é o chefe. O dia em que você for chefe pode fazer igualzinho, por vingança, mas por enquanto...
O passo seguinte para o total desespero é quando você lê a pauta da reunião. Após uns quinze ou vinte minutos, você ainda não conseguiu entender o que é que você tem a ver com aquele assunto.
Obviamente, nesse ponto, acabam surgindo algumas questões em sua conturbada cabeça. Será que deixei passar algum relatório? Será que apaguei algum e-mail? Será que não me deram algum recado? O chefe não ia me convocar (e o convocar fica em negrito na tua cabeça) se eu não estivesse nesse processo... mas... quando é que eu entrei no processo? que capítulo da novela eu perdi?
Quem mais foi chamado.... não, convocado para a reunião? Ah, meu Deus....
A lista é imensa e, mais que imensa, é de peso, gente graúda e - o que é o mais desastroso - você não tem intimidade absolutamente nenhuma com nenhum deles para perguntar qualquer detalhe do assunto em pauta.
É desse momento, até o dia e hora da fatídica reunião, que sua vida se torna um verdadeiro inferno. Pesquisas, leituras, apontamentos, anotações (tem diferença entre apontamento e anotação?), enfim, lá vai você esquecendo de todo e qualquer outro assunto e se preparando para a tal reunião.
Chega o dia. Com um trilhão e meio de papéis, pastinhas e outras tranqueiras você vai até a sala de reuniões e respira aliviado: foi o primeiro a chegar. Senta, arruma as coisas em uma forma lógica (para você, apenas para você), toma um copo de água e observa o próximo membro da reunião chegar.
E aí que você percebe que ter chegado cedo foi uma grande bobagem. O segredo para uma reunião não é chegar cedo ou tarde, mas chegar acompanhado. Quem chega primeiro tem que ficar num levanta-cumprimenta-senta, levanta-cumprimenta-senta, levanta-cumprimenta-cumprimenta- sen.. -ops, perdão-cumprimenta-senta, levanta-cumprimenta-senta, que parece que não para mais. Quem chega tarde tem que ficar brincando de ciranda cirandinha em torno da mesa, fazendo todos se levantarem (até que a sacanagem pode ser boa).
Mas o segredo é chegar acompanhado. Você entra conversando, sorrindo como se estivesse passando do quarto ao banheiro de sua casa ou, melhor, da casa de sua mãe. Quem chega sozinho fica olhando para um lado, para outro, para o um lado de novo, sempre na procura de um rosto amigo, de um conhecido para sentar-se ao lado - nem sempre encontra. Por isso amigo, sempre que for a uma reunião, nem que fique parado na porta do lado de fora, espera alguém chegar e entre junto (pela dica, quem quiser mandar sua contribuição, pode ligar para minha secretária que ela passa a conta para o depósito).
E então o chefe chega, acena a todos (vcs não queriam que ele ficasse dando a volta na mesa, não é?) e a reunião pode começar. A primeira fala é, para você, o total desastre: Bem senhores, conforme combinado na última reunião, temos agora que apresentar os estudos sobre o projeto. Nada de assuntos já debatidos, por favor, vamos ser produtivos. Comecemos do ponto em que paramos e, claro, levando em conta as considerações já realizadas. Todos de acordo?
Que última reunião? Já teve alguma reunião sobre esse assunto? Quando? Como? Você não estava. Você nunca esteve. Que considerações? Como é que você vai estar de acordo com algo que você não tem a menor idéia do que é? Pensando bem, a idéia de um colapso cardíaco não é totalmente ruim... o plano de saúda da empresa até que cobriria...
E o sub-chefe (normalmente o senhor de ar altamente antipático e pernóstico, sentado ao lado do chefe) continua: Vamos começar pela área de .....
Enquanto o olhar do sub-chefe corre a mesa você tem absoluta certeza que ele parou em você, abriu um sorriso maquiavélico, com olhos em chamas, o cheiro de enxofre tomou conta do ar e ele sentenciou: pela área de informática.
Ufa, não é a sua. E o dito cujo da informática diz: Claro, sem problemas, tudo certo, tudo em ordem, contudo alguns dos detalhes do sistema a ser empregado se referem a parte do estudo realizado pela área de .................................... engenharia.
Para.. ai que coisa, que martírio, esse cara precisa dar esse espaço todo para dizer que área que tinha que falar? que prazer mórbido em te torturar! e para de morder o dedo, tá dando na cara.
E para de balançar a perna também.
E para de acenar com a cabeça, para de entortar clipes, para de rabiscar no papel de anotação, para de suar, para de quebrar ponta de lápis...
E assim vão se seguindo as apresentações. Uma a uma e nada da sua. A cada nome, a cada área escolhida, você jura que seu coração não vai aguentar. Você já não consegue ouvir mais nada, nenhuma apresentação faz o menor sentido para você, também de tão nervoso não consegue acompanhar nada e
- Asderbaldo.
- Si-sim se-senhor. Da minha parte eu queria dizer que... é..
- Asderbaldo.
- Si-sim, se-senhor, e-eu já digo que no que é que tange o que o.......
- As-der-bal-do.
- S-se-senhor?
- Sendo a primeira vez que você toma contato com o assunto, gostaria que analisasse todas as propostas que foram colocadas e, na próxima reunião, nos apresentasse uma proposta para a divulgação do projeto. Não precisa ser nada muito elaborado, apenas venha com as idéias básicas e, se possível, uma idéia de custos e prazos para que possamos iniciar as discussões da sua parte, ok?
- Hehe
- Ok?
- Hehe...hic.
- Asderbaldo, você está me ouvindo? Asderbaldo... você está branco! Que foi? Ficou maluco filho de Deus?
- Hehe... he.hehe..heeeee.
E a copeira, que estava passando bem atrás de você nessa hora, bate no seu ombro: Chora não, seu Asdibardo... fica bunito não um homão desses chorá qui nem criança!